quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Responsável? Ninguém.


“Novos caloiros, sejam bem-vindos à Lusófona”. É assim que inicia um breve texto de boas-vindas e de apresentação escrito pelo Presidente do Conselho de Administração dessa Universidade, no site oficial da mesma. Esta primeira fase ganha um novo sentido e uma ironia que alimenta a minha visão pouco conveniente sobre o assunto.

É certo que a Universidade não é tutora nem exerce qualquer tipo de responsabilidade relativamente aos estudantes, normalmente maiores de idade, mais ainda quando os mesmos não estão nas instalações daquela nem em iniciativas por si organizadas.

Porém, a Universidade terá, certamente, relações com a Comissão de Praxes. Pelo menos, sabe que existe. Permite que exista. Devendo ter conhecimento das suas ações, mesmo que não o tenha, conforma-se com as iniciativas, que, não se opondo, acaba por fomentar.

Não querendo encontrar bodes expiatórios, sempre fui defensor de uma cultura de responsabilidade, em que todos devem responder, equitativamente, na medida da sua culpa. Ainda que não tenha nada que ver com o assunto, não me posso conformar que os responsáveis continuem a cortar sistematicamente para canto. Muda-se uma cabeça, abre-se um inquérito e, para o ano, continua tudo na mesma.

Sabe-se, agora, que, depois do Estado “ter feito o favor” de encontrar os corpos, está a ponderar investigar o assunto. Um mês depois, o pobre doente continua com amnésia seletiva (o meio mais comummente utilizado para enganar a namorada, os pais, os professores e os nossos superiores hierárquicos) sem ter, até ao momento em que escrevo, sido ouvido pelas entidades competentes.

“Bem-dito Salazar”, é o que nos apetece dizer neste país em que ninguém é responsável por nada.

Talvez tivesse sido diferente, fosse um daqueles seis miúdos filho de um deputado, de um membro do governo, de um notável ou de um membro daquelas seitas que vão gerindo as nossas vidas e que são quase tão obscuras como a verdade que se esconde atrás desta tragédia.

Não quero alimentar conspirações, nem levantar curiosidades, mas o assunto é muito mais sério do que as autoridades portuguesas o estão a encarar. É, aliás, um tema que deve ser encarado como motivo de reflexão nacional, desde os responsáveis pelas universidades ao próprio legislador. Não estamos a falar de cortes nos salários, de finanças ou futebol. Estamos a falar da vida das pessoas.

Todos (!) têm (!) de ser chamados à responsabilidade. Universidade(s), alunos, comissão de praxes, pais, PJ, Ministério Público.

O legislador, que adora criar legislação sobre quase tudo e quase nada, poderia, também, tirar um dia para tratar da questão das praxes, regulando-as ou proibindo-as, responsabilizando, especialmente e a nível criminal, todos aqueles que, direta ou indiretamente, participam em planos que humilham, que ofendem, que matam jovens.

Normalmente, o que se faz a quente é, tendencialmente, precipitado e errado. Mas este assunto não pode cair no esquecimento. E era o que faltava que, numa legislatura, se dedicasse mais atenção ao número de cães e gatos que um cidadão pode ter em casa do que o tempo que se investe a tratar de direitos fundamentais, direitos constitucionais, direitos humanos.

Num momento em que apelo à honra e à memória dos jovens, não posso deixar de referir que este será, provavelmente, o melhor – e também o mais triste – retrato do que é a sociedade portuguesa nos dias de hoje, nos tempos em que vivemos.

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