quinta-feira, 26 de julho de 2012

El (nuestro) Crá!


Depois de pegar na bola e de a colocar no chão, o silêncio apenas era interrompido pelos flashes das máquinas fotográficas e pelo bater do coração dos adeptos. Era um remate que se adivinhava num ar quase sufocante. O mundo parou à espera do que Matias era capaz de fazer.
O momento foi acompanhado num ansioso silêncio em Lisboa, em Manchester e por todo o mundo. A partir daí, do momento em que corre para a bola, colocando-a direitinha na baliza de Joe Hart, perante todo um mundo incrédulo, continuo a não saber explicar o que senti.
Esforçando-me por fazê-lo, ouço apenas o som da bola a bater na rede. A alegria das lágrimas que queriam cair dos meus olhos não me fizeram aperceber de que o coração aos saltos, algures entre o peito e a cabeça, quase me impedia de respirar. Os abraços e os gritos de golo, daquele golo de Matias Fernandez e do Sporting, são coisas que dificilmente irei esquecer.
Foi um tiro demasiado certeiro, um remate exageradamente perfeito. Foi um golo que fica para a memória. O próprio Matias, demasiado concentrado na genialidade com que marcou aquele livre, nem conseguiu ter mais imaginação para o festejar.
Foi História. Escrita a verde e banco.
Mesmo assim, não há maior injustiça que possa ser feita do que resumir o tempo que Matias passou no Sporting àquele golo, por mais vibrante que tenha sido. Porque falamos de um mágico, de um fora de série, daqueles que tratava a bola com a delicadeza com que se deve tratar uma princesa.
São jogadores como Matias Fernandez que fazem com que os miúdos sonhem. Concretiza a ideia romântica de que um futebolista, mais do que um atleta, é um artista.
Matias, mais do que futebolista, mais do que artista, era e é genial.
Há quem, não sendo do Sporting, não compreenda o facto de, neste momento de despedida, não estarmos suficientemente tristes. E, de facto, não estamos. Porque Matias vai, mas o que fez fica. Porque o que fez é intemporal, como intemporal também é o nosso Sporting. O nosso, meu. O nosso, teu. O nosso, do Matias.
Ainda não sendo oficial a sua saída, mas não deixando de ser provável, para Matias, as portas estão sempre abertas. Era melhor, muito melhor, se ficasse connosco. Mas, se não ficar, temos de respeitar a sua decisão, despedindo-nos com um agradecimento.
É que há quem, do lado de lá da segunda circular, tenha levado a mal que o Rojo (encarnado em espanhol) se tenha tornado Verde. São aqueles de Carnide, das jogadas dos túneis e dos balneários, onde, posso-o confirmar, quando não são agressivos, são deselegantes. E não têm pejo em dizer que mandam e que querem mandar, custe o que custar.
Matias, segundo o que se diz por baixo do campo, que é onde normalmente joga o Benfica, recebeu um convite para receber muito mais dinheiro do que recebe no Sporting. Tinha mais um ano de contrato, mas foi educado, cordial e sportinguista quando o transmitiu a responsáveis do seu clube.
É legítimo que Matias queira ganhar mais dinheiro. É, aliás, saudável, porque faz parte das ambições naturais de qualquer pessoa. Mas daí a faltar ao respeito ao clube que o acolheu, e onde escreveu páginas bonitas da sua história, vai um passo demasiado grande. Demasiado grande para que Matias o pudesse dar.
E, segundo o que dizem os jornais, estando de saída, a um ano de terminar o contrato, o Matias vai para outras paragens. Para a capital mundial dos românticos. Para a capital mundial da arte. Vai para um clube com mística, para um clube que é querido de todos nós.
O que eu desejo é que Matias seja feliz em Florença. E que faça aqueles adeptos tão felizes quanto nos fez a nós.
Estamos gratos. Muito gratos.
E, se quiser voltar, as portas estarão sempre abertas para El Crá.

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