domingo, 14 de março de 2010

À conquista de Madrid


A 11 de Março de 2010, Madrid cheirou a Lisboa e, nunca tanto quanto naquele dia, jamais tinha sido uma cidade tão verde.
Mesmo sem contar com Paulo Futre, Madrid deparou-se no passado dia 11 com uma invasão de 5 mil portugueses. Pretos, brancos, amarelos, ciganos, estudantes, doutores, professores, funcionários públicos, patrões e trabalhadores, advogados, médicos, taxistas, arquitectos e ex-jogadores de futebol, pessoas do Alentejo, do Algarve, de Braga, das ilhas, do Porto, de todo o país, emigrantes portugueses vindos de vários países da Europa, gente desde a extrema esquerda à extrema direita, todos de verde num dos mais memoráveis dias de convívio sportinguista.
Madrid foi invadida por portugueses, por portugueses do Sporting. Numa invasão que aconteceu, num primeiro momento, em plena Plaza Mayor, local onde turistas estupefactos, pela surpresa em ver tanta gente, não hesitavam em guardar o momento em filmes e fotografias.
Tal era a multidão que, muito antes da hora prevista, a Polícia se viu obrigada a ter de encaminhar aquela gente toda para o Vicente Calderon. O trajecto até ao estádio foi um dos momentos mais inesquecíveis que vivi enquanto sportinguista. Porque os espanhóis e espanholas que encararam aquela invasão olhavam para nós com um misto de choque, surpresa e pânico, que nos fez crer que, também para eles, o dia 11 de Março de 2010 será recordado pelo verde das ruas, pelo ruído dos tambores e das milhares de vozes, pelo movimento das bandeiras. Não é para menos. Porque não é todos os dias que vemos, mesmo em frente das nossas casas, dos nossos locais de trabalho, das ruas que mais frequentamos, um mar verde a passar, acompanhado pela polícia, em carrinhas, a pé e a cavalo. O trânsito esteve também ele parado durante largos minutos no centro da capital espanhola.
Só me consciencializei do que estava a viver quando olhei para trás, no primeiro cruzamento no trajecto até ao estádio, e vi que lá ao fundo havia ainda uma quantidade enorme de gente a sair da Plaza Mayor. Aquilo estava a acontecer numa quinta-feira à tarde, a centenas de quilómetros de Lisboa.
Foi a resposta aos que tentaram fazer comparações e pôr em cima da mesa a grandeza do Sporting. Ora, o Sporting, no dia 11, foi demasiado grande, mostrou não ter limites e qualquer comparação onde se queira incluir o Sporting é comparar o incomparável.
Não há palavras capazes de descrever o trajecto até ao estádio. Nem me vou esforçar por tentar sequer chegar perto de uma descrição, porque, como se dizia entre aquela gente, “só visto”. Só estando lá.
Como aquele grupo de sportinguistas chegou às imediações do Vicente Calderon, quase todos chegaram a tempo de assistir à simbólica entrega de uma coroa de flores em memória das vítimas mortais de um inqualificável atentado terrorista, o de 11 de Março, em Madrid. Esse gesto foi aplaudido de pé por todo o estádio, sendo que também no minuto 11 do jogo se registou um aplauso, pelos mesmos motivos.
Sobre o jogo, visto ao vivo por Maradona e Luís Figo, o resultado diz quase tudo. O Sporting teve, a partir da meia hora, um jogador a menos. E acabou com nove jogadores em campo. Ainda assim, perante um ataque bastante poderoso (que é a melhor coisa que o Atlético tem), o facto de ter sido defendido por mais 5 mil pessoas, além dos 9 jogadores, terá sido determinante para que o Sporting conseguisse não sofrer golos e trazer a decisão final para Lisboa. Nessas 5 mil pessoas esteve também o Sá Pinto, três filas em cima de mim, a apoiar incansavelmente a equipa.
É, de facto, de enaltecer o apoio de todos os adeptos que nem chegaram a sentir o frio, quase gelado, que se diz que por ali se sentia. Só foi pena que, ao contrário da comunicação social espanhola, os “media” portugueses não tenham dado, ao que se passou em Madrid, a cobertura adequada.
No fim do jogo, o agradecimento natural dos jogadores e dirigentes que sentiram o peso que os adeptos deram ao Sporting naquele dia. Os próprios jogadores do Atlético Madrid (a maioria deles), à saída do estádio também olharam com simpatia para a bancada norte do estádio.
Saímos do estádio a tempo de tirar uma fotografia e de fazer uma caminhada até ao autocarro, que era um entre “uma data deles”.
Na rádio, diziam os espanhóis, depois das críticas a Pellegrini, que o Atlético de Madrid nunca tinha sido superior ao Sporting. Isso, de certo modo e tendo em conta as ocorrências do jogo, confortava-nos.
Podem ler-se, em vários sites espanhóis, referências de jornalistas e comentadores ao Sporting, em que revelam a simpatia necessária para que alguns digam que nunca seremos esquecidos no Calderon e que leve outros a prometerem a compra de uma camisola leonina para o próximo verão.
Acabo este texto com uma frase curta, dita por um rapaz que estava à frente de mim na camioneta e que fez, como eu também fiz, mais de mil quilómetros durante o dia de ontem. Estávamos a regressar e parámos numa estação de serviço, esse rapaz ia a dormir no banco à minha frente e acordou com o acender as luzes, com os gritos brincalhões de um outro rapaz e, quando a porta do autocarro se abriu, entra um frio quase gelado por ali dentro. Foi então que ele se virou para trás com um ar ensonado e disse: “só mesmo pelo Sporting”.
Só mesmo.

Fotografia: A Norte de Alvalade

2 comentários:

Bruno Ferreira Costa disse...

António, não querendo estragar este excelente momento do Sporting, deixo-te aqui uma pergunta...relativa a um texto que escreves-te há bem pouco tempo:
Bettencourt deve continuar atendo ao trabalho do treinador da Académica e garantir a sua contratação ou olhar para o trabalho do actual treinador do Sporting?
Um abraço

António Lopes da Costa disse...

Bruno, esse será um assunto para ser analisado e reflectido. Carvalhal, como qualquer outro treinador, depende dos resultados.
Quando chegar a altura de decidir, de certeza que o presidente José Eduardo terá em conta o facto de ter sido Carvalhal o único a ter aceite treinar o Sporting. E foi aquele que pôs o coração dos sportinguistas bater mais forte.
Outro abraço para ti