Entre os mandatos de Guterres e Sócrates, e entre Sócrates e Costa, o PS nunca viveu de convicções. Não ofereceu uma ideia ao país, uma política alternativa, apenas tendo contribuído eficazmente para aumentar o número de gente empregada no domínio do humor, inspirando dezenas de jovens, nas rádios e televisões, com as célebres e inesquecíveis frases de que as dívidas não são para pagar e que a Parque Escolar foi uma festa.
E não há melhor transição de um
parágrafo para outro do que recorrendo à palavra que melhor caracterizou as
últimas governações socialistas. Foram festas, com fins anunciados em pântanos
ou no recurso desesperado a pedidos de resgate.
Entre esses períodos, assolado
pelo terrível caso da Casa Pia, e na sequência do, nunca esclarecido, caso
Freeport, os tapetes foram tirados aos líderes de transição, Ferro Rodrigues e
Seguro, no mesmo dia da semana em que José Sócrates conseguiu fazer toda – ou quase
toda – a sua licenciatura. Ao domingo.
Aos olhos dos portugueses, é
completamente inaceitável a forma como, internamente, se movem os interesses
socialistas, apenas em função do calendário eleitoral, com sequentes e
consequentes tiradas do tapete.
Porventura, a golpada mais grave,
do ponto de vista da estabilidade política, da ordem política e até
jurídico-constitucional, ocorreu durante a presidência de Sampaio, em que se
verificou uma conjugação perfeita de cenários, desde o caso Casa Pia à ida de
Barroso para a Comissão Europeia, a que correspondeu a reorganização interna no
PS, culminando na dissolução, nunca explicada, de uma Assembleia representativa
e legitimamente eleita pelos cidadãos.
Evidentemente, não esqueço aqueles
que, à direita, fizeram o jogo rasteiro do Partido Socialista, assumindo que
nunca ajudei a eleger, para o que quer que fosse, a falsa moeda de Cavaco ou a
conjugação desastrosa que, de um homem pequeno com voz grande, não permite
fazer, de Marques Mendes, um político com pensamento, pelo menos, coerente.
Porém, quase como obrigação
cívica e, porventura até, moral, não poderia deixar de relembrar alguns
episódios de democracia duvidosa que espelham na postura adotada, hoje, pelos
principais agentes políticos, sobretudo aqueles que, voltam agora até ao país
(mais ou menos) real, para lhes pedir o voto, agora, nas insólitas eleições
primárias.
Sendo evidente que se desembrulharam
temas como os que se prendem com as legislativas e presidenciais, não deixa de
ser curioso cair nas mesmas conclusões dos últimos 15 anos, em que o PSD (e o
CDS) foi chamado a governar na sequência de governações socialistas
completamente calamitosas do ponto de vista financeiro, em que o PS (e sempre
só o PS) foi para o governo com base em jogadas de bastidores encenadas através
da utilização dos poderes públicos e de uma espécie de segunda cara que o PS
adota internamente, e que permanece como uma espécie de face oculta aos olhos
dos portugueses.
Em setembro, o PS terá um António
como líder, mas que surgirá, forçosa e justamente, enfraquecido aos olhos da
opinião pública. Se for Seguro, é o mais do mesmo, o líder frouxo, amorfo, sem
chama nem projeto. Se for Costa, tenderemos a concluir que o será por força de
circunstâncias mais do que previstas, tendo iludido os portugueses (sobretudo,
os munícipes lisboetas e os camaradas de partido) ao mesmo tempo em que, na
sombra, delineava uma estratégia que terminou de uma forma completamente
anómala, tirando o tapete ao líder do PS após duas vitórias eleitorais.
Costa, a um nível interno, não fez
diferente daquilo que Sampaio foi capaz de fazer a nível nacional. E o PS,
decorridos todos estes anos, continua igual. Não tem projetos, não tem ideias e
vive com base numa lógica de deslealdade perante os seus pares em busca de um
eterno sonho de poder que culmina, sempre, com os cofres do Estado vazios.
Em quinze anos, nada mudou no PS,
o que se evidencia na consensualidade que suscita o nome do pantanoso Guterres
para candidato a Belém. A propósito, e no seguimento da imperdível entrevista
de Santana Lopes ao Expresso, já é tempo de se falar, à direita do PS, de um
nome para Presidente. Porque o guterrismo teve o seu tempo, teve o seu preço e deixem-nos,
pelo menos, pagar a fatura que ele nos deixou.