terça-feira, 17 de novembro de 2009

“O futebol não é tudo na vida.”



Esta frase, aparentemente vulgar, de Theo Zwanzige, no último adeus a Robert Enke, não acaba no ponto final. Vai muito além dele.
É uma frase que poderia ser perfeitamente título de um best-seller que chegasse, depois, às salas de cinema para ser um filme marcante de uma época.
Esta frase, pelas várias interpretações que lhe podem ser retiradas, poderia, e deveria, estar afixada num local visível em todos os recintos de futebol do mundo. Para que alguns adeptos pensassem duas vezes antes de agir irreflectidamente contra…seres humanos, como nós.
Como seria se aquele rapaz que matou um adepto do Sporting tivesse pensado nesta frase antes de atirar o very-light? Como seria que iriam agir os adeptos (contra jogadores, adeptos, adversários) se fossem, na altura, confrontados com essa frase? Como se iriam comportar membros de uma claque a entrar numa academia de jovens atletas se pensassem que o futebol não é tudo na vida?
Ainda hoje são notícia os vários incidentes na Argélia e no Egipto. Hoje é notícia a recepção (apenas tolerável, na minha opinião, tendo em conta o passado recente desse país) dos bósnios à selecção nacional portuguesa. Na semana passada foi notícia a “espera” feita pelas claques do Sporting aos jogadores da sua própria equipa. Todos os anos há pessoas esfaqueadas, carros e autocarros apedrejados, cachecóis roubados e queimados. Quantos anos de vida já perderam vários adeptos por causa de um desporto que deveria ser de entretenimento? Quantas pessoas já perderam a própria vida em estádios de futebol? A década de 90 (pelos momentos trágicos que marcaram dois clássicos do futebol português deveria servir de lição. Para vivermos o futebol com muito mais tolerância.
Até a verdade desportiva seria salvaguardada se todos os dirigentes desportivos, sobretudo aqueles que agora não olham a meios para atingir certos fins, pensassem que o futebol não é tudo na vida.
Eu tinha uma grande admiração pelo Robert Enke. Pelo homem e pelo atleta. E revolta-me pensar que, na situação em que ele estava, poderia ter sido alvo dos mesmos insultos que estão a ser feitos a atletas e funcionários de várias equipas de futebol. Revolta-me muito. Assim como me incomoda o facto de algum outro jogador poder estar a viver uma situação semelhante.
Há quem pense que é fácil viver do futebol. Há quem exija o que não pode ser exigido a um jogador. Porque um jogador não é uma máquina, é uma pessoa…que tem uma vida para viver. Para viver uma só vida que está longe de ser só futebol e dinheiro.
São sobretudo essas pessoas, que exigem o que humanamente não deve ser exigível e que têm essa visão redutora da vida de um profissional de futebol, que deveriam ter sempre presente que, atrás de um jogador, há uma família, a saúde, o sofrimento próprio de um ser humano e que o futebol não é tudo na vida.

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